O presidente da Argentina, Javier Milei, terá uma vida muito mais confortável a partir de 10 de dezembro, quando assumirão os novos deputados e senadores. Neste domingo, 23, o libertário teve uma vitória surpreende nas eleições legislativas e aumentará sua capacidade aprovar projetos e leis nos próximos dois anos de governo.
Com 98% das urnas apuradas, o partido governista A Liberdade Avança (LLA) conquistou 40% dos votos contra 31,6% do peronismo, a principal força opositora no Congresso. O peronismo é representado por diferentes partidos em cada província, mas o Força Pátria, de fundo kirchnerista, é hoje o principal deles.
“Aumentaremos o número de deputados de 37 para 101. E no Senado, passaremos de 6 para 20. Teremos o Congresso mais reformista da história argentina”, comemorou o presidente, que saiu vitorioso em 16 das 24 províncias argentinas.
Estes números, de fato, darão um Congresso muito mais amigável a Milei do que o dos últimos meses, que derrubou quase todos os seus projetos e vetos.
“[O novo Congresso] traz mais diálogo, maior capacidade de coalizão, maior construção de consensos. Acho que uma leitura no sentido de se ver plebiscitado e encorajado por resultados tão positivos”, explica o cientista político e professor da Universidade de Buenos Aires Facundo Galván.
Segundo ele, por mais que se fale de uma vitória do governo, deve-se interpretar os resultados como individuais de cada distrito argentino. “São 24 eleições diferentes, ou seja, não houve uma vitória do governo em todas as províncias, mas sim foi muito surpreendente alguns distritos, particularmente Província de Buenos Aires e Córdoba, onde claramente a vitória nas pesquisas não estava tão clara.”
Com os números parciais, que ainda podem modificar conforme mais urnas vão sendo contadas, o governo leva 64 assentos na Câmara de Deputados contra 46 do peronismo. No Senado, o LLA somou 13 novos nomes e o peronismo 9. Estavam em jogo 127 dos 257 assentos da Câmara de Deputados e 24 das 72 cadeiras do Senado.
Com essas bancadas, somadas com os de aliados do partido de direita PRO, de Mauricio Macri, Milei terá o terço necessário para avançar com seu projeto político.
Surpresa
O resultado surpreende porque, há quase dois meses, o presidente sofreu uma dolorosa derrota de 14 pontos percentuais para o peronismo na província de Buenos Aires. Com seus 40% de eleitorado, a maior província argentina é considerada um termômetro do clima nacional. Mas hoje o libertário rompeu com a hegemonia peronista na província.
De acordo com Galván, muitos fatores podem explicar porque as pesquisas não capturaram esta vitória, sendo o principal deles o “voto envergonhado” em Milei. “Muita gente talvez priorize a situação econômica, a estabilidade, a ordem, antes da situação vinculada à macropolítica”, diz.
Os argentinos vêm no último semestre demonstrando uma certa apatia e desilusão com o futuro econômico, mas é inegável que Milei teve triunfos. O principal deles foi a contenção da inflação, que foi de 25% em seu primeiro mês e agora está abaixo de 3%.
Existe também uma diferença entre o que os eleitores levam em consideração nas eleições provinciais e nas nacionais. O pleito da província de Buenos Aires de 7 de setembro, ainda que tenha se tornado um plebiscito do governo, costuma pautar temas muito mais locais e recebe forte influência de governadores, prefeitos e deputados locais.
As nacionais não, a figura de Milei pode ter jogado muito mais a seu favor.“[A eleição de setembro] basicamente é uma eleição onde houve muita mobilização de base que não existiu para este processo eleitoral. E isso também pode ajudar a explicar a situação que não foi captada pelos pesquisadores.”

O mais surpreendente dos resultados de hoje foi a vitória libertária na província de Buenos Aires, depois da forte derrota de setembro. “A eleição de setembro foi particular. O resultado de hoje condiz mais com as pesquisas que eram anteriores à eleição de 7 de setembro, que não nos esqueçamos que foi realizada no contexto de um grande escândalo”.
Poucos dias antes das eleições bonaerenses, estourou um escândalo de corrupção que supostamente envolvia a irmã do presidente, Karina Milei. O caso ainda está em investigação, mas foi suficiente para fazer o libertário ser castigado nas urnas.
Facundo também lembra que, apesar de ser um reduto peronista, já houve derrotas da força na província. A própria Cristina Kirchner chegou a perder corridas para o Senado em Buenos Aires.
Apesar da vitória de hoje, Milei reforçou que seguirá com seu plano de realizar uma reforma de seu gabinete a partir de amanhã. O presidente tenta atender uma demanda popular de apresentar mudanças políticas para o próximo dois anos, além de estar costurando novas alianças.