O presidente dos EUA, Donald Trump, intensificou o clima de tensão política nesta quarta-feira (8) ao sugerir a prisão do prefeito de Chicago, Brandon Johnson, e do governador de Illinois, JB Pritzker, ambos do Partido Democrata. A declaração, feita em meio a uma escalada de conflitos entre o governo federal e administrações locais, ocorre no contexto do envio de tropas da Guarda Nacional à região metropolitana de Chicago, uma decisão que tem gerado protestos e acusações de abuso de poder.
O embate começou a ganhar forma na terça-feira (7), quando cerca de 200 soldados da Guarda Nacional do Texas chegaram à cidade de Elwood, a 50 km de Chicago, para se preparar para uma operação na terceira maior cidade dos EUA. A justificativa oficial do governo Trump é a proteção de agentes do Serviço de Imigração e Controle de Alfândega (ICE), que, segundo o presidente, estariam sob ameaça devido à resistência de autoridades locais em colaborar com políticas federais de imigração. No entanto, tanto Johnson quanto Pritzker classificam a medida como uma manobra política, sem embasamento real, destinada a intimidar opositores.
Trump tem adotado um discurso inflamado contra Chicago, descrevendo a cidade como um epicentro de violência e criminalidade, apesar de dados policiais indicarem uma redução significativa nos índices de crimes. Relatórios recentes mostram que os homicídios em Chicago caíram 31% até agosto deste ano, com 278 casos registrados, se comparado com o mesmo período do ano passado. Essa contradição entre a narrativa presidencial e as estatísticas tem alimentado críticas de que o governo está fabricando uma crise para justificar intervenções federais em cidades governadas por democratas.
A resistência de Chicago às políticas de Trump não é nova. O prefeito Brandon Johnson assinou uma ordem executiva estabelecendo “zonas livres do ICE”, que proíbem operações de imigração em propriedades municipais e locais privados que se oponham à presença de agentes federais. A medida foi duramente criticada pela Casa Branca, que a classificou como “doentia”. Já o governador Pritzker acusou o presidente de usar as tropas como instrumentos de um “teatro político” e levou a questão à Justiça, embora uma liminar para barrar o envio das tropas do Texas tenha sido negada por uma juíza federal, que alegou precisar de mais informações.
Além disso, o secretário de Guerra, Pete Hegseth, designou 300 soldados da Guarda Nacional de Illinois para atuar em Chicago, mas essa mobilização foi bloqueada por uma decisão judicial estadual. A falta de clareza sobre a missão exata das tropas federais tem aumentado a desconfiança de que o objetivo principal seja político, e não de segurança pública.
Uma onda de intervenções federais
A situação em Chicago não é um caso isolado. Desde o início de seu segundo mandato, em janeiro deste ano, Trump anunciou o envio de tropas da Guarda Nacional para pelo menos dez cidades norte-americanas, todas administradas por democratas, incluindo Baltimore, Memphis, Washington D.C., Nova Orleans, Oakland, São Francisco e Los Angeles. A justificativa recorrente é o combate à violência e a proteção de instalações federais, mas dados mostram que os crimes violentos têm diminuído na maioria dessas localidades. Em Portland, por exemplo, os homicídios caíram 51% entre janeiro e junho de 2025, passando de 35 para 17 casos.
Em Portland, a tensão também escalou com protestos frequentes em frente a uma instalação do ICE, que culminaram em confrontos com agentes federais utilizando gás lacrimogêneo. A governadora do Oregon, Tina Kotek, rejeitou as acusações de “insurreição” feitas pelo governo federal e afirmou que o estado está unido contra o que chamou de “policiamento militar”. A secretária de Segurança Interna, Kristi Noem, por sua vez, pressionou o prefeito de Portland, Keith Wilson, ameaçando enviar ainda mais agentes federais caso a segurança local não fosse reforçada.
Um caminho para a ditadura?
A sociedade norte-americana tem acompanhado com crescente preocupação as ações do governo Trump, que muitos veem como um ataque direto às liberdades democráticas. As ameaças de prisão contra adversários políticos, o uso de decretos emergenciais para acelerar políticas anti-imigração e a mobilização de tropas em cidades governadas por opositores são vistos como sinais de um perigoso avanço autoritário. Analistas apontam que essas medidas, somadas à desobediência a decisões judiciais e às prisões de imigrantes sem justificativa legal, violam princípios constitucionais e sugerem a construção de um regime de exceção.
O fato de as intervenções federais se concentrarem exclusivamente em cidades e estados liderados por democratas reforça a percepção de que as ações têm motivação política. “Trump está usando o poder do governo federal para punir seus adversários e consolidar controle, ignorando dados que mostram a redução da criminalidade e desrespeitando a autonomia local”, afirmou um analista político em Chicago, que preferiu não se identificar.
Enquanto isso, a Justiça enfrenta o desafio de lidar com as sucessivas violações legais do governo. Em setembro, um juiz federal em Los Angeles declarou que o envio de tropas da Guarda Nacional à cidade durante protestos anti-imigração foi uma violação deliberada da lei. Em Portland, uma audiência está marcada para esta quinta-feira (9) para discutir a legalidade do envio de tropas, em meio a um cenário de crescente polarização.
Futuro incerto
À medida que o segundo mandato de Trump avança, o uso de forças federais contra administrações locais e a retórica agressiva contra opositores políticos continuam a alimentar o temor de que os EUA estejam caminhando para um regime autoritário. Em Chicago, o prefeito Johnson mantém um tom de resistência, declarando que “rezará” para que o presidente mude de postura, enquanto Pritzker promete continuar lutando na Justiça contra o que considera uma afronta à democracia.
Com a sociedade dividida e as instituições democráticas sob pressão, o futuro político dos EUA permanece incerto, enquanto o espectro de uma ditadura ganha contornos cada vez mais nítidos para muitos cidadão norte-americanos.